Não dê as costas ao relógio biológico


Tenho me lembrado muito de poemas que falam da angústia da passagem do tempo, da impotência da gente em não congelar para sempre as melhores coisas da vida como nossas mães, por exemplo. “Por que Deus permite que as mães vão-se embora?” Drummond não é o único imerso nesse sentimento devastador, apesar de falar dele de forma magistral.

Adélia Prado também pede o impossível: “me dê a mão, me cura de ser grande. Meu Deus, me dê cinco anos...” E Lya Luft fez os mais belos poemas sobre o que nenhuma mãe quer: ver seus filhos crescerem. “Vens tão entregue e sei que não és minha; és do teu futuro que eu não alcançarei inteiro. Presa no meu abraço eu te sinto voar...” Dorme filho meu, que eu te contemplo. Teu olho escuro me interroga como se soubesses muito mais coisas do que eu... Anjo esperado, logo um homem, dramaticamente um homem, mas meu filho...”

Estranho que nesta semana eu tenho sentido o coração muito apertado, repleto de pensamentos escorregadios... Mas seria diferente com tantas perdas me rodeando? A ciência de que minha madrinha está morrendo e lá, no Rio, longe dos meus olhos... Não sei se ela volta, não sei se vou vê-la ainda viva, não sei se pego o avião e vou para lá... Minha mãe, que não é mais aquela mãe que eu sempre tive, e sim outra mulher, marcada para sempre com a dor e a mutilação de uma doença sombria...

Também fiquei sabendo que uma amiga de infância e madrinha do meu casamento perdeu a única irmã, com 29 anos, para o câncer. Mais uma vez esta doença desonesta... Sem falar de outra velha camarada que descobriu que o filho de quatro anos tem uma doença degenerativa chamada esclerose tuberosa. Sem contar a minha iluminada soprano de Sampa, que viveu o terror de acompanhar o filho internado na UTI durante um mês...Nossa, parece que o clima anda muito pesado neste planetinha azul...

Nestas horas, o refúgio na poesia é restaurador. E a certeza de que os filhos estão no quarto ao lado também. Acho que é por isso que ando tão apegada aos meus garotos, morrendo de amores por eles, invadindo o sono dos dois no meio da noite só para vê-los dormir com aquela paz da inocência... E aí sussurro no ouvido de cada um: a mamãe te ama!

Dá uma saudade insana de ter um bebezinho novamente. É a tal dor do tempo indo embora, de não querer que nossas crias se percam de nós. De não querer acreditar que nós mesmos estamos dando tchau para a juventude. A escada dos anos só tem uma direção, com seus inevitáveis degraus de ausências e, com muita sorte, também de tranqüilidade e sabedoria. Se fosse corajosa o bastante, encararia uma terceira gravidez. Porque nada é mais delicioso que um serzinho crescendo ao lado da gente. Eles mostram que a vida vale a pena mesmo com tanta história triste. Vou pensar seriamente em entrar na fila da adoção.

Amigos, por isso escrevo este desabafo. Àqueles que experimentam o sofrimento, aqui ofereço o meu calor. Àquelas que fogem da alegria, não percam mais tempo. Eu quero ver a barriga das não-mães crescer para que eu possa extravasar meus mimos maternais. Entrar nas lojinhas fofas de roupinhas de bebê, decorar o quartinho... Fazer altas transferências e projeções que só Freud explica.

Acho que vou virar uma chata grudenta me preocupando com a alimentação, o bem-estar e a yoga destas futuras mamães do mundo... É milagroso ter mulheres grávidas perto da gente. Magia única que também merece poesia: “Eu vi a mulher preparando outra pessoa. O tempo parou pra eu olhar para aquela barriga...”

Pois é, companheiras, antes dos terninhos, existia a maternidade. E o Vinícius que me perdoe, mas ser mãe, sim, é que é fundamental. Me espanto com esta afirmação nada feminista, mas não me arrependo de ser queimada na praça junto com os sutiãs, acessórios imprescindíveis para quem carrega o peso de ser mulher tamanho 44.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Ousadia

Presentim de Natal

Horizonte de Eventos